quinta-feira, 10 de junho de 2010

O SONHO VIOLENTADO

Em 1934 a mulher brasileira conquista o direito ao voto. Cecília não se encontra entre aquelas que lutaram nas praças públicas por esse direito. Por quê? Porque é outro o seu campo de ação social. Ela está nos jornais e nas escolas. Nesse mesmo ano é chamada para dirigir o Centro Infantil, a ser instalado no Pavilhão Mourisco, em Botafogo. Vê no convite a possibilidade de pôr em prática as idéias sobre o novo modelo de educação que tanto tem defendido na imprensa. Constrói aí a primeira Biblioteca Infantil da cidade do Rio de Janeiro. Correia Dias transforma o porão numa cidade encantada. Ali as crianças podem afinal exercer livremente a sua imaginação em atividades criativas várias: pintura, leitura, música, desenho.

O sonho, porém, como todo sonho, não dura muito. Intrigas políticas levam ao fechamento da biblioteca. Violenta devassa, promovida pela Polícia Política do governo de Getúlio Vargas, destrói inclusive cerâmicas de inspiração marajoara criadas por Correia Dias. A explicação para tal vandalismo: livros, considerados perigosos à educação infantil, entre eles, (pasmem!) As aventuras de Tom Sawyer, de Mark Twain.

Uma ironia, um contra-senso, acontecer isso logo com ela. Apesar de progressista, sempre fora cética demais para aderir a qualquer partido político e bastante espiritualista para deixar-se seduzir pelo marxismo. Coisas da ditadura.




SEUS LIVROS



Espectros, 1919

l Nunca mais... e Poema dos Poemas, 1923

l Baladas para El-Rei, 1925

lCriança, meu amor, 1927

l Viagem, 1939

l Vaga música, 1942

l Mar Absoluto e Outros Poemas,1945

l Retrato natural, 1949

l Amor em Leonoreta, 1951

l Dez noturnos de Holanda & O aeronauta, 1952

l Romanceiro da Inconfidência, 1953

l Pequeno Oratório de Santa Clara, 1955

l Pistóia, Cemitério Militar Brasileiro, 1955

l Canções, 1956

l Romance de Santa Cecília, 1957

l Obra poética, 1958

l Metal Rosicler, 1960

l Poemas escritos na Índia, 1961

l Solombra, 1963

lOu isto ou aquilo, 1964

l Crônica trovada da cidade de Sam Sebastiam, 1965

l Poemas italianos, 1968

l Ou isto ou aquilo & Inéditos, 1969

l Cânticos, 1981

l Oratório de Santa Maria Egipcíaca, 1986 .

Desde 1998 vem sendo desenvolvido projeto de publicação de toda a obra em prosa da poeta, coordenado pelo camonista Leodegário de Azevedo Filho.

Em 2001, em comemoração ao centenário de nascimento, a Editora Nova Fronteia, do Rio de Janeiro, publica Poesia Completa, em dois volumes. Edição organizada por Antonio Carlos Secchin.

terça-feira, 8 de junho de 2010

Motivo


Eu canto porque o instante existee a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,não sinto gozo nem tormento.Atravesso noites e diasno vento.
Se desmorono ou se edifico,se permaneço ou me desfaço,— não sei, não sei.
Não sei se ficoou passo.Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:— mais nada.

Despedida


Por mim, e por vós, e por mais aquilo que está onde as outras coisas nunca estão, deixo o mar bravo e o céu tranqüilo: quero solidão.

Meu caminho é sem marcos nem paisagens.

E como o conheces? - me perguntarão. - Por não ter palavras, por não ter imagens. Nenhum inimigo e nenhum irmão.

Que procuras? Tudo.Que desejas? - Nada.

Viajo sozinha com o meu coração.

Não ando perdida, mas desencontrada. Levo o meu rumo na minha mão.

A memória voou da minha fronte.

Voou meu amor, minha imaginação...

Talvez eu morra antes do horizonte.

Memória, amor e o resto onde estarão? Deixo aqui meu corpo, entre o sol e a terra.

(Beijo-te, corpo meu, todo desilusão! Estandarte triste de uma estranha guerra...)

Quero solidão.


Tenho fases, como a Lua; fases de ser sozinha, fases de ser só sua.

Nem tudo é fácil


É difícil fazer alguém feliz, assim como é fácil fazer triste.

É difícil dizer eu te amo, assim como é fácil não dizer nadaÉ difícil valorizar um amor, assim como é fácil perdê-lo para sempre.

É difícil agradecer pelo dia de hoje, assim como é fácil viver mais um dia.

É difícil enxergar o que a vida traz de bom, assim como é fácil fechar os olhos e atravessar a rua. É difícil se convencer de que se é feliz, assim como é fácil achar que sempre falta algo.

É difícil fazer alguém sorrir, assim como é fácil fazer chorar.

É difícil colocar-se no lugar de alguém, assim como é fácil olhar para o próprio umbigo.

Se você errou, peça desculpas...

É difícil pedir perdão? Mas quem disse que é fácil ser perdoado? Se alguém errou com você, perdoa-o...

É difícil perdoar? Mas quem disse que é fácil se arrepender? Se você sente algo, diga...

É difícil se abrir? Mas quem disse que é fácil encontrar alguém que queira escutar? Se alguém reclama de você, ouça...

É difícil ouvir certas coisas? Mas quem disse que é fácil ouvir você?Se alguém te ama, ame-o...

É difícil entregar-se? Mas quem disse que é fácil ser feliz? Nem tudo é fácil na vida...

Mas, com certeza, nada é impossível Precisamos acreditar, ter fé e lutar para que não apenas sonhemos, Mas também tornemos todos esses desejos, realidade!!!

NÃO: JÁ NÃO FALO DE TI



já não falo de ti, já não sei de saudades.

Feche-se o coração como um livro, cheio de imagens,de palavras adormecidas, em altas prateleiras,até que o pó desfaça o pobre desespero sem força,que um dia, pode ser, parece tão terrível.

A aranha dorme em sua teia, lá fora, entre a roseira e o muro.

Resplandecem os azulejos- e tudo quanto posso ver.

O resto é imaginado, e não coincide, e é temeráriocismar.

Talvez se as pálpebras pudesseminventar outros sonhos, não de vida...Ah! rompem-se na noite ardentes violas,pelo ar e pelo frio subitamente roçadas.

Por onde pascerão, nestes céus invioláveis,nossas perguntas com suas crinas de séculos arrastando-se...Não só de amor a noite transborda mas de terríveis crueldades, loucuras, de homicídios mais verdadeiros.

Os homens de sangue estão nas esquinas resfolegando,e os homens da lei sonolentos movem letrassobre imensos papéis que eles mesmos não entendem... Ah! que rosto amaríamos ver inclinar-se na aérea varanda?Nem os santos podem mais nada.

Talvez os anjos abstratosda álgebra e da geometria.

PERGUNTO-TE ONDE SE ACHA A MINHA VIDA



Pergunto-te onde se acha a minha vida.
Em que dia fui eu. Que hora existiu formada
de uma verdade minha bem possuída

Vão-se as minhas perguntas aos depósitos do nada.

E a quem é que pergunto? Em quem penso, iludida
por esperanças hereditárias? E de cada
pergunta minha vai nascendo a sombra imensa
que envolve a posição dos olhos de quem pensa.

Já não sei mais a diferença
de ti, de mim, da coisa perguntada,
do silêncio da coisa irrespondida.

Cecília Meireles

sábado, 29 de maio de 2010

Canção da Tarde no Campo




Caminho do campo verde
estrada depois de estrada.
Cerca de flores, palmeiras,
serra azul, água calada.

Eu ando sozinha
no meio do vale.
Mas a tarde é minha.

Meus pés vão pisando a terra
Que é a imagem da minha vida:
tão vazia, mas tão bela,
tão certa, mas tão perdida!

Eu ando sozinha
por cima de pedras.
Mas a tarde é minha.

Os meus passos no caminho
são como os passos da lua;
vou chegando, vai fugindo,
minha alma é a sombra da tua.

Eu ando sozinha
por dentro de bosques.
Mas a fonte é minha.

De tanto olhar para longe,
não vejo o que passa perto,
meu peito é puro deserto.
Subo monte, desço monte.

Eu ando sozinha
ao longo da noite.
Mas a estrela é minha.

Desenho "Cecília Meireles"


Em carta de 1946 ao amigo poeta e ator Rui Affonso, Cecília dizia querer que a percebessem – “como uma criança antiga que a poesia de São Miguel no Açores nutriu, numa infância de sonho no regaço de uma avó dolorida, heróica e nobremente sentimental”.
Aquarela poética inspirada em trecho do poema de Cecília Meireles "Desenho":

Fui morena e magrinha como qualquer polinésia,
e comia mamão, e mirava a flor da goiaba.
E as lágrimas me espiavam, entre os tijolos e as trepadeiras,
e as teias de aranha nas minhas árvores se entrelaçavam

Isso era um lugar de sol e nuvens brancas,
onde as rolas, à tarde, soluçavam mui saudosas...
O eco, burlão, de pedra, ia saltando,
entre vastas mangueiras que choviam ruivas horas.

Os pavões caminhavam tão naturais por meu caminho,
e os pombos tão felizes se alimentavam pelas escadas,
que era desnecessário crescer, pensar, escrever poemas,
pois a vida completa e bela e terna ali já estava.

Como a chuva caía das grossas nuvens, perfumosa!
E o papagaio como ficava sonolento!
O relógio era festa de ouro; e os gatos enigmáticos
fechavam os olhos, quando queriam caçar o tempo.

Vinham morcegos, à noite, picar os sapotis maduros,
e os grandes cães ladravam como nas noites do Império.
Mariposas, jasmins, tinhorões, vaga-lumes
moravam nos jardins sussurrantes e eternos.

E minha avó cantava e cosia.
Cantava canções de mar e de arvoredo, em língua antiga.
E eu sempre acreditei que havia música em seus dedos
e palavras de amor em minha roupa escritas.

Minha vida começa num vergel colorido,
por onde as noites eram só de luar e estrelas.
Levai-me aonde quiserdes! - aprendi com as primaveras
a deixar-me cortar e a voltar sempre inteira.

aceitação



"É mais facil pousar o ouvido nas nuvens
E sentir passar as estrelas
Do que prendê-lo à terra e alcançar o rumo dos teus passos

É mais fácil, também, debruçar os olhos no oceano
E assistir, lá no fundo, ao nascimento mudo das formas,
Que desejar que apareças, criando com o teu simples gesto o sinal de uma eterna esperança

Não me interessa mais nem as estrelas, nem as formas do mar, nem tu,
desenrolei de dentro do tempo minha canção: não invejo as cigarras:
também vou morrer de cantar."

Cecilia Meireles

" Amor Perfeito "




Naquela nuvem, naquela,
mando-te meu pensamento:
que Deus se ocupe do vento.

Os sonhos foram sonhados,
e o padecimento aceito.
E onde estás, Amor-Perfeito ?

Imensos jardins da insônia,
de um olhar de despedida
deram flor por toda a vida.

Ai de mim que sobrevivo
sem o coração no peito.
E onde estás, Amor-Perfeito ?

Longe, longe, atrás do oceano
que nos meus olhos se aleita,
entre pálpebras de areia...

Longe, longe... Deus te guarde
sobre o seu lado direito,
como eu te guardava do outro,
noite e dia, Amor-Perfeito.

Censura da era Vargas perseguiu poeta

Se a história da literatura desconhece a Cecília Meireles da luta política, desconhece também a que sofreu perseguições da censura de Vargas, dos católicos e em concursos literários.

O primeiro desencontro com Alceu Amoroso Lima se dá em 1929, quando Cecília concorre à vaga de professor de literatura brasileira pela Escola Normal. A jovem professora ainda não era a consagrada poetisa de ''Viagem'' (1939), ''Vaga Música'' (1942) e ''Mar Absoluto'' (1945), embora já fosse considerada pelos modernistas cariocas uma revelação, com seus livros ''Espectros'' (1919) e ''Baladas para El-Rei'' (1925).

Concorreu à pretendida vaga com a tese ''O Espírito Vitorioso'', um trabalho francamente liberal, no qual discorria sobre a liberdade individual na sociedade. E perdeu. Antônio Carlos Villaça, em ''Tema e Voltas'', é enfático: "Clóvis Monteiro derrotou Cecília, que sempre guardou tristeza de Alceu (Amoroso Lima) ter votado em seu adversário".

A contenda, até aí, poderia se resumir puramente a problemas de ordem pedagógica. Clóvis Monteiro era um técnico de educação sem qualquer pretensão literária. Sem dúvida, seu perfil, numa época em que a valorização da tecnocracia ganhava espaço, agradou muito mais do que o da jovem professora e poeta.

Passados cinco anos e todo o furor causado pela "Página de Educação", Cecília inaugura em 1934, junto com seu marido, o pintor Correia Dias, o Centro de Cultura Infantil, no "vazio e abandonado prédio" (nas palavras dela) do Pavilhão do Morisco, na praia de Botafogo, no Rio. Na administração de Anísio Teixeira, o centro reunia "mil e quinhentas inscrições de leitores".

Em 1937, em plena vigência do Estado Novo, o centro é invadido pelo interventor do Distrito Federal, que apreende de sua biblioteca ''As Aventuras de Tom Sawyer'', de Mark Twain, por considerá-lo comunista. O caso teve repercussão internacional e nacional. No seu artigo "A Última Aventura de Tom Sawyer", o acadêmico Austregésilo de Athayde lamenta que o ''New York Times'' tenha denunciado ao mundo que, no Brasil, o clássico americano fora retirado das prateleiras de uma biblioteca infantil por ser considerado "material subversivo".

Depois de invadido pela polícia, a prefeitura resolve fechar o Centro de Cultura Infantil e, em seu lugar, instala um posto de arrecadação fiscal.

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Cecília Meireles - A musa contra o ditador


Nos autoritários anos 30, a poeta lutou na imprensa pela democracia e contra o ensino religioso.

"Cecília, és tão forte e tão frágil. Como a onda ao termo da luta. Mas a onda é água que afoga: Tu, não, és enxuta." Manuel Bandeira (em "Improviso", no livro ''Belo Belo'') Cecília Meireles na década de 30 rompeu com todos os tabus de uma sociedade ao defender uma política menos casuísta e uma educação moderna.

Por meio de seus artigos sobre política, educação e cultura, Cecília nos oferece uma outra face daquela que foi considerada a musa diáfana, fluida e etérea da literatura brasileira. Sinônimo de ilha e isolamento (para Sérgio Milliet), a escritora cuja poesia não estava "inserida no drama coletivo de sua geração" (para o crítico Mário da Silva Brito), em sua trajetória intelectual a Cecília Meireles que deixou suas marcas foi uma defensora da idéia universal de democracia, num período em que a incoerência e as paixões pelo autoritarismo arrastaram jovens intelectuais.
por Valéria Lamego

blogger cariricaturais

O MENINO AZUL




O menino quer um burrinho
para passear.
Um burrinho manso,
que não corra nem pule,
mas que saiba conversar.

O menino quer um burrinho
que saiba dizer
o nome dos rios,
das montanhas, das flores,
_ de tudo o que aparecer.

O menino quer um burrinho
que saiba inventar
histórias bonitas
com pessoas e bichos
e com barquinhos no mar.

E os dois sairão pelo mundo
que é como um jardim
apenas mais largo
e talvez mais comprido
e que não tenha fim.

(Quem souber de um burrinho desses,
pode escrever
para a Rua das Casas,
Número das Portas,
ao Menino Azul que não sabe ler.)

Ou isto ou aquilo





Ou se tem chuva e não se tem Sol
ou se tem Sol e não se tem chuva!


Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se pões o anel e não se calça a luva!


Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.



É uma grande pena que não se possa estar
ao mesmo tempo nos dois lugares!

Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e não gasto o dinheiro.


Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo…
e vivo escolhendo o dia inteiro!


Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fique tranquilo.


Mas não consegui entender ainda
que é melhor: se isto ou aquilo.


Cecília Meireles, 1990

sala de concerto Cecilia Meireles


A Sala Cecília Meireles localiza-se no Largo da Lapa nº 47, Lapa, Rio de Janeiro, Brasil, CEP 20021-170, telefone: +55 21 2332-9160.

É uma tradicional e conceituada casa de concertos de música de câmara no cenário cultural da cidade, assim denominada em homenagem à poetisa (e pianista amadora) Cecília Meireles.

O edifício foi erguido em fins do século XIX, tendo funcionado originalmente como um hotel, com o nome de Grande Hotel da Lapa. Já hospedou importantes fazendeiros e políticos da República Velha.

Em 1948 foi reformado, transformando-se em um cinema, com o nome de Cine Colonial.

Duas décadas mais tarde, visando à criação de um espaço para a música erudita, em particular a música de câmara, o antigo cinema deu lugar à Sala Cecília Meireles.

Canção do Sonho Acabado




Já tive a rosa do amor
- rubra rosa, sem pudor.
Cobicei, cheirei, colhi.
Mas ela despetalou
E outra igual, nunca mais vi.
Já vivi mil aventuras,
Me embriaguei de alegria!
Mas os risos da ventura,
No limiar da loucura,
Se tornaram fantasia...
Já almejei felicidade,
Mãos dadas, fraternidade,
Um ideal sem fronteiras
- utopia! Voou ligeira,
Nas asas da liberdade.
Desejei viver. Demais!
Segurar a juventude,
Prender o tempo na mão,
Plantar o lírio da paz!
Mas nem mesmo isto eu pude:
Tentei, porém nada fiz...
Muito, da vida, eu já quis.
Já quis... mas não quero mais...

Cecília Meireles

LUA ADVERSA




Tenho fases, como a lua
Fases de andar escondida,
fases de vir para a rua...
Perdição da minha vida!
Perdição da vida minha!
Tenho fases de ser tua,
tenho outras de ser sozinha.

Fases que vão e vêm,
no secreto calendário
que um astrólogo arbitrário
inventou para meu uso.

E roda a melancolia
seu interminável fuso!
Não me encontro com ninguém
(tenho fases como a lua...)
No dia de alguém ser meu
não é dia de eu ser sua...
E, quando chega esse dia,
o outro desapareceu...

Cecília Meireles

"O Amor...

É difícil para os indecisos.
É assustador para os medrosos.
Avassalador para os apaixonados!
Mas, os vencedores no amor são os
fortes.
Os que sabem o que querem e querem o que têm!
Sonhar um sonho a dois,
e nunca desistir da busca de ser feliz,
é para poucos!!"

Cecília Meireles

Inscrição na Areia




O meu amor não tem
importância nenhuma.
Não tem o peso nem
de uma rosa de espuma!

Desfolha-se por quem?
Para quem se perfuma?

O meu amor não tem
importância nenhuma.

Cecília Meireles

Primeiro Motivo da Rosa

Vejo-te em seda e nácar,
e tão de orvalho trêmula, que penso ver, efêmera,
toda a Beleza em lágrimas
por ser bela e ser frágil.

Meus olhos te ofereço:
espelho para face
que terás, no meu verso,
quando, depois que passes,
jamais ninguém te esqueça.

Então, de seda e nácar,
toda de orvalho trêmula, serás eterna. E efêmero
o rosto meu, nas lágrimas
do teu orvalho... E frágil.

Cecília Meireles

A AVÓ DO MENINO




.A avó
vive só.
Na casa da avó
o galo liró
faz "cocorocó!"
A avó bate pão-de-ló
E anda um vento-t-o-tó
Na cortina de filó.
A avó
vive só.
Mas se o neto meninó
Mas se o neto Ricardó
Mas se o neto travessó
Vai à casa da avó,
Os dois jogam dominó.

Sonhos da menina



A flor com que a menina sonha
está no sonho?
ou na fronha?
Sonho
risonho:
O vento sozinho
no seu carrinho.
De que tamanho
seria o rebanho?
A vizinha
apanha
a sombrinha
de teia de aranha . . .
Na lua há um ninho
de passarinho.
A lua com que a menina sonha
é o linho do sonho
ou a lua da fronha?

Uma Palmada Bem Dada




É a menina manhosa
Que não gosta da rosa,
Que não quer A borboleta
Porque é amarela e preta,
Que não quer maçã nem pêra
Porque tem gosto de cera,
Porque não toma leite
Porque lhe parece azeite,
Que mingau não toma
Porque é mesmo goma,
Que não almoça nem janta
porque cansa a garganta,
Que tem medo do gato
E também do rato,
E também do cão
E também do ladrão,
Que não calça meia
Porque dentro tem areia
Que não toma banho frio
Porque sente arrepio,
Que não toma banho quente
Porque calor sente
Que a unha não corta
Porque fica sempre torta,
Que não escova os dentes
Porque ficam dormentes
Que não quer dormir cedo
Porque sente imenso medo,
Que também tarde não dorme
Porque sente um medo enorme,
Que não quer festa nem beijo,
Nem doce nem queijo.
Ó menina levada,
Quer uma palmada?
Uma palmada bem dada
Para quem não quer nada!

A Bailarina





Cecília Meireles



Esta menina

tão pequenina

quer ser bailarina.



Não conhece nem dó nem ré

mas sabe ficar na ponta do pé.



Não conhece nem mi nem fá

Mas inclina o corpo para cá e para lá.



Não conhece nem lá nem si,

mas fecha os olhos e sorri.



Roda, roda, roda, com os bracinhos no ar

e não fica tonta nem sai do lugar.



Põe no cabelo uma estrela e um véu

e diz que caiu do céu.



Esta menina

tão pequenina

quer ser bailarina.



Mas depois esquece todas as danças,

e também quer dormir como as outras crianças.

Bibliografia de Cecilia Meireles



"...Liberdade, essa palavra
que o sonho humano alimenta
que não há ninguém que explique
e ninguém que não entenda..."
(Romanceiro da Inconfidência)



Filha de Carlos Alberto de Carvalho Meireles, funcionário do Banco do Brasil S.A., e de D. Matilde Benevides Meireles, professora municipal, Cecília Benevides de Carvalho Meireles nasceu em 7 de novembro de 1901, na Tijuca, Rio de Janeiro. Foi a única sobrevivente dos quatros filhos do casal. O pai faleceu três meses antes do seu nascimento, e sua mãe quando ainda não tinha três anos. Criou-a, a partir de então, sua avó D. Jacinta Garcia Benevides.
Conclui seus primeiros estudos — curso primário — em 1910, na Escola Estácio de Sá, ocasião em que recebe de Olavo Bilac, Inspetor Escolar do Rio de Janeiro, medalha de ouro por ter feito todo o curso com "distinção e louvor". Diplomando-se no Curso Normal do Instituto de Educação do Rio de Janeiro, em 1917, passa a exercer o magistério primário em escolas oficiais do antigo Distrito Federal.

Dois anos depois, em 1919, publica seu primeiro livro de poesias, "Espectro". Seguiram-se "Nunca mais... e Poema dos Poemas", em 1923, e "Baladas para El-Rei, em 1925.

Casa-se, em 1922, com o pintor português Fernando Correia Dias, com quem tem três filhas: Maria Elvira, Maria Mathilde e Maria Fernanda, esta última artista teatral consagrada. Suas filhas lhe dão cinco netos.

Publica, em Lisboa - Portugal, o ensaio "O Espírito Vitorioso", uma apologia do Simbolismo.

Correia Dias suicida-se em 1935. Cecília casa-se, em 1940, com o professor e engenheiro agrônomo Heitor Vinícius da Silveira Grilo.

De 1930 a 1931, mantém no Diário de Notícias uma página diária sobre problemas de educação.

Em 1934, organiza a primeira biblioteca infantil do Rio de Janeiro, ao dirigir o Centro Infantil, que funcionou durante quatro anos no antigo Pavilhão Mourisco, no bairro de Botafogo.

Profere, em Lisboa e Coimbra - Portugal, conferências sobre Literatura Brasileira.

De 1935 a 1938, leciona Literatura Luso-Brasileira e de Técnica e Crítica Literária, na Universidade do Distrito Federal (hoje UFRJ).

Publica, em Lisboa - Portugal, o ensaio "Batuque, Samba e Macumba", com ilustrações de sua autoria.

Colabora ainda ativamente, de 1936 a 1938, no jornal A Manhã e na revista Observador Econômico.

A concessão do Prêmio de Poesia Olavo Bilac, pela Academia Brasileira de Letras, ao seu livro Viagem, em 1939, resultou de animados debates, que tornaram manifesta a alta qualidade de sua poesia.

Publica, em 1939/1940, em Lisboa - Portugal, em capítulos, "Olhinhos de Gato" na revista "Ocidente".

Em 1940, leciona Literatura e Cultura Brasileira na Universidade do Texas (USA).

Em 1942, torna-se sócia honorária do Real Gabinete Português de Leitura, no Rio de Janeiro (RJ).

Aposenta-se em 1951 como diretora de escola, porém continua a trabalhar, como produtora e redatora de programas culturais, na Rádio Ministério da Educação, no Rio de Janeiro (RJ).

Em 1952, torna-se Oficial da Ordem de Mérito do Chile, honraria concedida pelo país vizinho.

Realiza numerosas viagens aos Estados Unidos, à Europa, à Ásia e à África, fazendo conferências, em diferentes países, sobre Literatura, Educação e Folclore, em cujos estudos se especializou.

Torna-se sócia honorária do Instituto Vasco da Gama, em Goa, Índia, em 1953.

Em Délhi, Índia, no ano de 1953, é agraciada com o título de Doutora Honoris Causa da Universidade de Délhi.

Recebe o Prêmio de Tradução/Teatro, concedido pela Associação Paulista de Críticos de Arte, em 1962.

No ano seguinte, ganha o Prêmio Jabuti de Tradução de Obra Literária, pelo livro "Poemas de Israel", concedido pela Câmara Brasileira do Livro.

Seu nome é dado à Escola Municipal de Primeiro Grau, no bairro de Cangaíba, São Paulo (SP), em 1963.

Falece no Rio de Janeiro a 9 de novembro de 1964, sendo-lhe prestadas grandes homenagens públicas. Seu corpo é velado no Ministério da Educação e Cultura. Recebe, ainda em 1964, o Prêmio Jabuti de Poesia, pelo livro "Solombra", concedido pela Câmara Brasileira do Livro.